sexta-feira, 3 de junho de 2011

Garimpeiros Digitais

por Felipe Pontes

O meu avatar de elfo, de pele cinza e cabeleira branca, encontra Honand, um sacerdote gordo, careca e barbudo, em uma pousada da pacata aldeia de Dolanaar. Conversamos em inglês, e rapidamente ele repassa minha encomenda: 1.500 moedas de ouro, pelas quais paguei US$ 8, com cartão de crédito. O regulamento proíbe, mas não é difícil comprar ouro virtual no World of Warcraft (WoW) — com seus 12 milhões de usuários, é o jogo online mais popular do mundo. Ele é mais ou menos como um Second Life, só que povoado por elfos, anões, orcs e outros seres mágicos. Nesse mundo fantástico, moedas de ouro são usadas para comprar armas, armaduras, montarias. Quem pode, paga para obtê-las sem esforço — ou seja, sem perder horas acumulando pontos neste reino virtual. Parece um comércio irrelevante entre esforçados e preguiçosos, mas agora virou assunto para o Banco Mundial.

A organização, que ajuda países na luta contra a miséria e determina a linha da pobreza no globo, publicou em abril um relatório de 58 páginas sobre a labuta dos guerreiros que coletam ouro virtual. De acordo com o documento, mais de 100 mil chineses pobres e sem escolaridade ganham a vida como jogadores profissionais de games online. Esse trabalho, chamado em inglês de gold farming (cultivo de ouro), não é tão divertido quanto um aficionado por jogos eletrônicos poderia imaginar. Os garimpeiros digitais passam mais de 12 horas por dia matando monstros que reaparecem no mesmo lugar, entre outras tarefas tediosas, para coletar dinheiro de mentira e vendê-lo por dólares de verdade a outros jogadores, em sua maioria de ricos países ocidentais. Basicamente, eles fazem o serviço sujo para que seus clientes possam se dedicar apenas à parte mais legal do jogo.

Segundo o relatório do infoDev, programa do Banco Mundial com foco em inovações tecnológicas, o mercado de serviços terceirizados em jogos online movimentou US$ 3 bilhões em 2009. O gold farming é responsável por 75% desse valor. O resto está distribuído em serviços como o power leveling, quando um jogador paga para outro usar seu personagem, aumentar o nível dele num jogo e devolver mais tarde. "Um em cada quatro usuários gastam seu dinheiro em negócios desse tipo", afirma Vili Lehdonvirta, especialista em economia virtual da Universidade Aalto, na Finlândia, e autor do documento do infoDev. Estima-se que 121 milhões de pessoas estejam cadastradas atualmente nesses games. Só a companhia que criou o WoW, a americana Blizzard, movimentou US$ 1 bilhão em 2009 com o título, de acordo com um ranking da revista Forbes.


0 comentários:

Postar um comentário